“O
amor é de grátis” - foi o que escutei um dia desses de soslaio de
uma conversa sobre as coisas deste nosso mundo econômico-social na qual se filosofava que não existia almoço
grátis.
Bem,
é verdade, mesmo que não haja como mensurar, o amor é algo muito
maior do que qualquer enredo de telenovela, um misterioso “X”
mais do que uma charada a ser resolvida.
O
fato é que amamos “de grátis”. É comum se escutar esse “de
grátis” vez ou outra. Acho que nada é mais verdadeiro que dizer
que “o amor é de grátis”. Sendo assim gostaria de te dizer que
te amo, mesmo na improbabilidade de meus sonhos impossíveis.
Simplesmente te amo, “de grátis”, como dizia a personagem Mussum
do programa televisivo de humor “Os Trapalhões”, talvez poucos
se recordem dele, mas aquela personagem nos traz a lembrança de que
talvez se possa encarar o ato de amar “de grátis” com uma piada.
Uma
piada! É assim mesmo que me sinto, como uma grosseira piada ao amar
desinteressadamente num universo social no qual tudo é calculado em
seus deveres e haveres. Aceite então esta minha fala solitária e
desengonçada, provavelmente mais uma peça de comédia do que uma
lírica entrada em um paraíso perfeito.
Nesta
ocasião lembro-me que estou adentrando os jardins da imperfeição.
Amar significa aceitar a condição do outro, ou como se diz: ao que
ama, o feio bonito lhe parece.
Observem
que já estamos em companhia da comédia, do jardim dos loucos e das
aventuras sem pé nem cabeça dos aventureiros que se largam ao mundo
sem olhar para trás. Deves saber que poderíamos até cair no engodo
de que esta coisa de amar se resume a uma frase curta que ilustra
figurinhas colecionáveis, e por outro lado também se pode acreditar
que o verso desta afirmação também é verdadeiro, o amor é tão
largo quanto curto em sua definição, mas de que adiantam todas
essas tergiversações, quando vier o próximo inverno saberei que
você não estará comigo e então sem qualquer palavra saberei que é
ou não amar.
É
na solidão que aprendemos o valor das palavras e no silêncio de
observar o outro em seu artesanato vivencial. Sabes que eu te amo, em
ais de uma sequência de amores impostores e personagens refratários
a toda explicitação.
Simplesmente
iniciei sempre esta viagem de amar o impossível.
Tudo
bem – diz o lugar-comum dos conselhos – que se deve se jogar na
amplidão das nuvens e voar com as asas que ainda não vemos.
Asseguram os conselheiros que nós as teremos, e que em algum momento
elas se abrirão como um paraquedas pré-programado para abrir em uma
altura determinada.
Assim,
vou eu novamente a dizer-te secretamente que te amo, pois que dizer
mesmo em significantes vocábulos de uma língua traduzível não
seriam eficazes. E nem mesmo a língua mágica dos comediantes de
rua, o grumelot, serviria para este propósito. Posso até ensaiar um
grumelot nestas reticências…
Mas
perceba que tinha razão quando disse que o amor parece refratário a
qualquer linguagem, no amor não há linguagem conhecida, talvez seja
algo mais do pensamento, algo translúcido e fora da nossa percepção
comum.
Após
o fim dos tempos irei lamentar de que te disse pouco o quanto te
admirava, e recordarei somente quando ias em teu caminho e eu te
observava, deixando-te passar, como a brisa que passa e embala o
nosso rosto numa tarde quente de verão.
Somente
isso é mais do que suficiente para crer, que vale a pena saber que
“o amor é de grátis”, totalmente sem taxas alfandegárias, sem
impostos sem revistas, sem detectores de mentiras.
No
amor vale amar, é assim que se lê em tantos lugares comuns. Então,
caríssimo amor saiba que estou por aqui te amando mesmo assim, e se
agora desdobro o meu soliloquio diante do mar é porque imagino a
possibilidade de talvez aquela coisa, lá na linha do horizonte, ser
você em um pequeno barquinho sendo carregada pelas ondas para os
meus braços.
Diz
uma voz no fundo de minha alma que te aguarde aqui na areia, não
porque se deva temer estas miragens como armadilhas das encantadoras
sereias. Dizem que os barquinhos no mar sonham com um porto seguro
onde chegar.
E
se há um barco no mar olhando para o continente, que seja eu este
porto que te espera, portanto vem que estou aqui.
E
se desdobro a faina de construir esta fantasia é porque como dizem:
“o amor é de grátis” e podemos usufruir dele mesmo em sua longa
espera. Podemos estar protegidos da corrosão dos espíritos vazios
que se entorpecem de coisas vãs sem nunca saber que amar é algo
assim tão bom.
Hoje sonhei que quando voltasse a caminhar na areia
tu te juntarias a mim e se poderiam ver as marcas de nossos passos
gravados por um instante antes que as ondas as desmanchassem.
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